
O Homem de crachá tem o nome de João, Pedro, Paulo, Valdemar, chame-o como quer chamar. O Homem tem 21 ou 38 anos e muitas histórias tristes para contar. Este homem que não vive, vive por falar, que a vida que ele vive é muito dura de aturar. Contudo, vemos o Homem vivendo a balbuciar, ao sair de casa cedo, — estou indo trabalhar —, e no fim da tarde, ao respirar, tudo que ele quer é voltar para casa e descansar. Outrossim, é verdade que o vemos em outros lugares: boates, viadutos, bares, o vemos também aqui, onde ele está agora, neste cais, sozinho como outrora. O Homem pensa sobre a vida e sobre os amores não correspondidos, e depois daqui, pelos becos escondidos, vai a uma festa, encher a cara até o fundo, se jogar na noite, se perder de si e do mundo.
O Homem não tem culpa de ser tão solitário, vazio, triste, ordinário, não tem culpa de viver assim, pelos cantos, ouvindo cantos que não encantam, enfim. Embora nada o encante, o Homem sorri, agoniante, tentando maquiar o mundo onde está, o trabalho, o fato que tem de acordar cedo, muito cedo. Este é um homem que chora pelas noites mal dormidas, pelos banhos demorados, pelo sono que não vem, pelos dias mal humorados. Todavia, este Homem só quer ser amado, amar, ser revigorado, ele quer ser feliz. Porém quem vê o Homem, vê tristeza, mágoas, solidão, melancolia. Quem vai amar alguém assim? Ninguém. Você amaria?
O Homem, muitas vezes foi enganado, mas também enganou a si mesmo, em um ou mais amores mentirosos, ninguém amou ninguém. Na vida deste homem, muitas mágoas permanecem, o nome delas eu não sei, mas uma delas foi loira e depois morena, foi ruiva e colorida, foi corte e ferida, foi o começo do fim, o início da dor, do ir e vir, do medo e da intensa vontade de sumir. O Homem chora horas e horas, não consegue mais viver assim.
O Homem sai de casa exatamente às seis, vai ao trabalho, faz um milhão de coisas idiotas, sem sentido além de mera compilação de inutilidades. Além disso, ele almoça sempre o mesmo prato: arroz, feijão, salada e um copo de suco de manga. Em outros momentos, o Homem anda pela cidade, olhando os letreiros, procurando alguma cartomante para chamá-la caloteira. O Homem grita em silêncio pelas longas ruas que logo chegam ao fim, e sem ter para onde ir, o Homem para por aqui, no cais, caindo em lágrimas que se vão, com o tempo e o passar das águas.
O Homem é um pobre homem, tinha sonhos, mas não vê sentido em nada mais. Ele não tem cachorro, tampouco papagaio, odeia amar os animais. Ademais, o Homem odeia muitas outras coisas, como: café frio, noite quente e um luar meio diferente. Porém, ele também tem seus gostos e costumes, como: beber água ou tequila, de dose em dose, pelos bares, para esquecer a vida. Entre outras características, o Homem não é alto, são um metro e noventa centímetros de pura pequenez. Afinal, quem não se sente gigante jamais alcançará o céu. Não obstante, deixando de lado frases clichês, voltaremos ao nosso protagonista, pois precisamos dar a ele mais atenção, enfim, o Homem não sente mais vontade de viver, ele não quer mais sentir como se nunca tivesse sendo visto, ele quer não existir.
O Homem irá sair deste cais, andar pelas ruas desta cidade, beber, foder, gritar, ser quem nunca foi. O Homem vai chegar em casa, sujo e vazio, sem ninguém para o amparar, e então, morrerá, nesta mesma noite. O Homem irá preparar um cenário, com flores, perfumes e bastante cor, como nunca antes fez. Este homem pegará uma lâmina e cortará os próprios pulsos, naquele cenário, ali na sala, assistindo o seu filme favorito, eu não sei qual é, não me pergunte, pergunte a ele. Aliás, pergunte mais coisas a ele, pode ser que ele queira conversar. Entretanto, não adianta mais perguntar, pois o Homem já se convenceu e percebeu que só ele pode e vai entender a si mesmo. Só ele sabe o que sente e só ele sabe o que fazer. Ninguém jamais entrará em sua mente.

Este obra está licenciada com uma Licença Creative Commons Atribuição - CC BY-NC-ND 4.0.
Uaaau! Perfeita!
ResponderExcluirObrigado, linda😍
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