
Era só um dia de sol lá naquela pequena cidade, na qual vivi por muitos anos; nesse dia, mais ou menos pelo meio da tarde, eu estava deitado em minha cama, lendo algum livro, não lembro qual, mas devia ser algum romance clássico, — são os meus preferidos, diga-se de passagem. Quando naquele momento, ouvi tocar o meu celular, era uma mensagem de WhatsApp de um amigo que vivia em uma cidade vizinha, não muito longe e nem tão perto; um meio termo, nem lá, nem cá, como dizem. Ele me perguntou se eu estava bem, logo eu respondi que sim, e perguntei o mesmo a ele, que de maneira mútua, afirmou que sim, estava bem. Posteriormente, ele me perguntou quais eram os meus planos para a semana, se eu iria para alguma festa ou algum bar, sair, beber, curtir; eu disse que não, não tinha nada programado.
Vendo a minha completa disponibilidade, esse amigo que me enviara mensagem me convidou a ir em sua cidade para uma grande festa, no convite ele dizia que eu ficaria em sua casa por alguns dias antes da festa e outros mais depois dela. Contudo, eu olhei o meu saldo no banco, o meu dinheiro na carteira, percebi que era pouco, mas decidi viver essa aventura, então me organizei, arrumei a mala e embarquei no primeiro ônibus maltrapilho que passou no dia seguinte. Comigo, levei a vontade de me divertir, de quem sabe tentar uma dança ou algo a mais. Chegando lá, fui recebido com alegria por meu amigo e seus familiares, era clima de festa na cidade, afinal, era um grande show, tinham algo para comemorar, não lembro muito bem do que se tratava e tampouco o motivo real de tanta farra. Mas isso pouco importa, faltavam dois dias para a festa e eu já estava deveras animado.
Escolhi a dedo aquela roupa a qual usaria, uma calça em tons terrosos, uma camisa preta para disfarçar quaisquer gordurinhas que pudessem surgir e também porque o black me deixa com um ar misterioso — é uma cor belíssima, afinal de contas. Coloquei alguns acessórios, como pulseiras, cordões e anéis, todos pretos ou em tons que remetem ao luto. Nem ao menos parecia que eu estava a caminho de uma festa daquele estilo, entretanto, eu pouco me importava, aquele era o meu jeito de me vestir e estava tudo às mil maravilhas. Partimos, então, para aquele baile, — é assim que chamam hoje em dia. Chegando lá, me deparei com muita gente, algumas pessoas conhecidas, outras nem tanto e muitas eu jamais havia visto; normal para uma festa com milhares de pessoas de todos os lugares.
Andei pelo ambiente por horas e horas, com meu amigo e amigos dele, cansei. Depois de tanto andar, parei, comprei uma água e me permiti a observar aquele local, aquelas pessoas, aquelas músicas, aquele clima frio e ao mesmo tempo tão propício ao calor, com tantos corpos ali juntinhos uns aos outros, alguns dançando, outros conversando, outros beijando, outros, assim como eu, apenas observando. Olhando para os lados o tempo todo, tentando encontrar nos olhares algo que pudesse, de alguma forma, me encantar. Não demorou muito, logo eu desisti e andei novamente, não dancei, não somente porque não sei essa prática, mas porque senti que aquela noite me traria algo mais que uma dança.
Depois que percebi que a noite não era para danças e tampouco para qualquer outra fútil curtição, decidi tentar mais uma vez aquela ação outrora praticada: parar, beber a minha água e apenas observar, e mesmo que olhassem para mim de uma forma meio estranha como quem julga um observador, eu permaneceria ali, até que os olhos me fossem cheios de algo antes nunca visto. Não demorou muito, em um momento de descuido, quando meu coração pouco esperava, o atingi com um forte golpe, implacável; olhei para ela como se não houvesse mais um mundo no qual eu estava inserido, era como se cada célula do meu corpo tivesse se voltado para aquela paisagem, sem qualquer tipo de defesa ou retaliação, estava entregue.
Ela se cobria de um all black que combinava com as cores que eu usava, ao lado dela pequenos seres que pouco importam, pois, ela da forma que brilhava era o mais belo espetáculo que já tive o prazer de ver. As luzes ao seu redor favoreciam o vermelho do seu batom, que refletia nas poucas nuvens que surgiam com inveja do seu brilho. Eu, por outro lado, estava paralisado, não ouvia o que me diziam, apenas acenava com a cabeça em sinal de concordância, por pura educação; meus olhos brilhavam tanto que podiam ser confundidos com alguns daqueles refletores de alta potência que iluminavam o palco daquele artista, que nunca em sua vida teve o talento suficiente para compor uma melodia tão linda quando ela.
Meu amigo me cutucou perguntando o que tanto eu olhava, eu respondi lentamente que não era nada, por medo de revelar a ele que naquele momento eu era o homem mais feliz do mundo; medo de ter a minha felicidade roubada; medo de perder por um instante que seja a visão daquela gloriosa rainha. Então, daquela forma, eu o ignorei, afinal ele tampouco existia agora; no meu mundo só existia eu e ela, naquele momento, com aquele clima, com aquela sensação de que tudo seria nosso, de que todas as estrelas se apagariam só para verem o nosso brilhar. E era verdade, todas elas se apagaram, e os outros planetas se curvaram para ela, a nossa guia, aquela para quem olhamos em noites de paixão, aquela que está em cada verso da minha pobre poesia, a lua.

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