Naquele instante de ansiedade, medo e insensata angústia, eu sorri como se não houvesse um amanhã e fosse a minha última chance de sorrir. Sorri como se toda a dor fosse acabar e no outro dia, pela manhã, nada de sentimentos ruins ou aquela sensação de que irei viver mais um dia como outro antes dele ou depois, triste e apático. Naquele instante, todo o meu corpo sorriu, numa sincronia que antes a minha pobre coordenação motora não permitiria. O meu corpo gritou de felicidade, esbravejou porque antes não havia sentido tamanha alegria, tamanha euforia.
Meu sorriso era largo, e sorria também junto dele todos os meus olhares, que tinham sim uma direção a qual não revelarei, ou pelo menos não tão facilmente. Estávamos nessa dança de olhares, de reflexos, que se cruzavam rapidamente, num disfarce constrangido, revestido de paixão. Os olhos afogados em um brilho forte, tão pequenos e amassados pelas montanhas vermelhas que no rosto se apresentavam tão meigas. E então o meu solitário sorriso ganhou companhia num abraço de sorrisos, que não se soltaram mais.
Nesse abraço, não só os sorrisos se abraçaram, mas os corações, as peles, os cabelos, as paixões e as temperaturas, já igualadas num calor escaldante. Os sorrisos, que vestiam roupas de verão, se despiram pouco a pouco e logo nus, um no outro, fizeram do amor um espetáculo de sorrisos bobos e apaixonados, esses sorrisos foram intensificando a paixão, ao ponto de causarem dor no momento da partida. Uma despedida dos sorrisos, que se fecharam, é verdade, mas permanecem abertos um para o outro.
Os corações, antes abraçados, revestidos de peles em fogaréu, não esfriaram jamais, as suas batidas, em sincronia perfeita, em desatino e insensatez, não se permitiram cessar. Então, corações e peles se juntaram novamente, e sempre juntos estão. Mesmo, às vezes, sem o sorriso que me faz sorrir, ando sorrindo mesmo só, rindo para as paredes brancas como a pele que abraçou a minha. As paredes castanhas, como o castanho que abraçou o meu. Os cachos que abraçaram as minhas ondas, e em ondas de olhares e sorrisos, restaram só risos bobos.

Este obra está licenciada com uma Licença Creative Commons Atribuição - CC BY-NC-ND 4.0.